A Cruz : O catolicismo tem vindo a estruturar a sociedade portuguesa. Mas que lugar tem ocupado Portugal na Igreja universal?
João Miguel Almeida: O catolicismo português teve uma influência muito grande, particularmente em África nas ex-colónias, e principalmente em Angola e Moçambique onde o catolicismo ainda é a religião mais praticada hoje. Até os líderes marxistas destes países admitiram que o catolicismo era a religião oficial. Isto não ocorreu sem conflitos porque estava muito ligado ao colonialismo. Mas esta herança permaneceu e a própria Igreja Católica encontrou um lugar de influência nestes países.
Na África, outras ex-colônias foram influenciadas pelo catolicismo português: Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe. Mas os missionários portugueses também foram para a Ásia. Foram os jesuítas, em particular, que estabeleceram o alfabeto latino no Vietname. Outras ordens missionárias portuguesas trabalharam desde a Índia até ao Japão.
O catolicismo português continua a ser muito popular, ligado a Fátima por exemplo, e a outras figuras como Santo António em Lisboa. Está muito enraizado na sociedade, mas não tem necessariamente esta dimensão intelectual que o catolicismo francês pode ter, porque durante a ditadura de Salazar (1932-1968) as possibilidades de debate eram limitadas. A influência de Portugal na Igreja não se deu através de muitos teólogos de renome.
Essa influência com as ex-colônias ainda existe?
JMA: De certa forma sim, mas agora funciona em ambos os sentidos e as relações mudaram muito desde os tempos coloniais. Muitos jovens leigos portugueses vão trabalhar em África para ordens religiosas ou organizações ligadas à Igreja Católica. Ao contrário da era colonial, os padres africanos trabalham agora nas paróquias portuguesas. A reputação da Universidade Católica Portuguesa atrai muitos estudantes africanos para estudar aqui.
O Papa Francisco criou recentemente o cardeal Américo Aguiar, bispo auxiliar de Lisboa, elevando para quatro o número de cardeais eleitores portugueses. Qual é a influência deles no Vaticano?
JMA: Algumas figuras da Igreja portuguesa ocuparam efectivamente posições importantes. O cardeal José Tolentino Mendonça, ex-arquivista do Vaticano e atual prefeito do dicastério para a cultura e a educação, é um intelectual, poeta e ensaísta importante para os portugueses. Porém, ainda é um pouco cedo para dizer qual a sua real influência.
É também o caso do Cardeal Carlos Azevedo (assessor do dicastério para a cultura e a educação, nota do editor). Historiador de formação, deixou uma importante obra sobre a história da Igreja portuguesa. Mas aqui, novamente, é difícil definir a sua importância na escala da Igreja Católica como um todo.
Então poderíamos imaginar um papa português no futuro?
JMA: E porque não ? (Risos.) Temos um papa argentino, então porque não um papa português! Como disse, em caso de conclave só haverá quatro cardeais portugueses – o que já é significativo face à dimensão do país. Podemos também contar com os laços entre a Igreja portuguesa e africana.
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