Febre do lítio atinge Portugal

No promontório rochoso que domina o “seu” vale, Aida Fernandes abre bem os braços, como se abraçasse os verdes montes à sua frente, onde serpenteiam as ruelas do campo. Nada perturba o silêncio que reina sobre esta paisagem idílica de arvoredos. Nem mesmo o som das vacas de chifres compridos, que encontramos com mais frequência do que os homens nas sinuosas estradas que levam a Covas do Barroso, uma aldeia de 180 almas no norte de Portugal.

“Não temos nada além dessa natureza e, ao mesmo tempo, temos tudo o que precisamos, respira esta agricultora de 43 anos, que cria, com o marido, vinte e seis vacas da raça indígena Barrosa, cuja carne é reconhecida em todo o país. Não há lojas, nem cinema, mas esta paisagem não tem preço, assim como a qualidade dos produtos da terra e a pureza da água dos rios. Com 500 euros, vivemos melhor do que quem, na cidade, ganha 1.500. Mas se a mina vier, perderemos tudo e teremos que ir embora…”

Aida Fernandes, agricultora, é uma ativista ativa contra as minas de Barroso.  Ela acredita que a maior riqueza é ter a terra para fornecer o alimento que ela precisa.  E, segundo ela, o dinheiro que as minas eventualmente trariam seria apenas temporário.  Aqui, acima de Covas do Barroso, 22 de janeiro de 2022.

Enquanto a Sérvia anunciou de surpresa, em 20 de janeiro, que estava pondo fim ao projeto de mineração de lítio ao longo do rio Jadar, no oeste do país, pela empresa anglo-australiana Rio Tinto, após meses de protestos massivos, Portugal está prestes a fazer o contrário. Lisboa poderá desbloquear nas próximas semanas o projeto da maior mina a céu aberto da Europa Ocidental deste minério estratégico, utilizado no fabrico de baterias para carros elétricos, nas terras escassamente habitadas da região do Barroso, classificadas como Património Agrícola Mundial, 150 quilómetros a nordeste do Porto.

Leia também Artigo reservado para nossos assinantes “Devemos reavaliar o custo real da mudança para o carro elétrico”

A empresa Savannah Resources, com sede em Londres, trabalha no projeto desde 2017. Obteve a licença de exploração e já realizou prospecções que lhe permitiram identificar jazidas de espodumênio, minerais muito ricos em lítio, contendo cerca de 287.000 toneladas do metal precioso. Suficiente para produzir baterias para 500.000 veículos elétricos por ano por cerca de dez anos, graças a um projeto de mina a céu aberto de 542 hectares, composto por quatro crateras profundas e uma enorme pilha de escória.

Vista de Covas do Barroso, 22 de janeiro de 2022. Ao fundo é possível ver as colinas próximas que foram alvo de sondagens exploratórias.

Seis novas áreas

Esta empresa de investimento britânica ainda não redigiu a versão final do estudo de viabilidade, que deve determinar a rentabilidade do projeto, sendo o custo de produção consideravelmente superior ao das lagoas de evaporação de salmoura que extrai o lítio da América Latina, onde o principal reservas estão localizadas. E aguarda apenas o parecer das autoridades portuguesas sobre o estudo de impacto ambiental. As conclusões, iminentes, foram adiadas após as eleições legislativas antecipadas, que decorreram no domingo 30 de janeiro em Portugal.

Você tem 73,15% deste artigo para ler. O seguinte é apenas para assinantes.

Marco Soares

"Leitor. Defensor da comida. Fanático por álcool. Fã incondicional de café. Empresário premiado."

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *