Eram meia-noite e vinte do dia 25 de abril de 1974 quando a Rádio Renascença tocou a música “Grandola, vila morena”, título de Zeca Afonso, que posteriormente foi banida do ar.
Aos primeiros apontamentos o MFA (Movimento das Forças Armadas) compreendeu. A “reviravolta histórica” pode começar. Após 48 anos de ditadura, os militares agrupados neste movimento assumiram o controle de pontos estratégicos de todo o país.
O objectivo agora é mudar o poder sem violência e convencer a população a aderir ao MFA.
Apenas uma instrução para isso: os portugueses são chamados a ficar em casa enquanto se aguarda o fim do golpe que vem sendo cuidadosamente preparado há várias semanas.
São 10 horas. A jornalista e ex-presa política Diana Andringa relembra com emoção aquela manhã: “Saí às ruas. Observei as pessoas durante horas… Não sabíamos como isso iria terminar, mas já estava acontecendo uma possível revolução.
Movimento popular
As instruções do MFA não foram respeitadas… Uma enorme multidão saiu pelas ruas de Lisboa. As imagens de arquivo subjacentes a este documentário, narrado por Lio, são surpreendentes. Sob o olhar das câmeras, a revolução dos ilhós está em andamento. E devemos este símbolo do cravo à Celeste Caeiro, florista profissional. Embora os portugueses oferecessem comida ou cigarros aos soldados, eles só tinham cravos para dar. Ela os entregou aos homens, que os colocaram principalmente na ponta das armas.
O governo estabelecido não durará muito sob a pressão do povo e do exército. Depois disso, inicia-se um período de dois anos. Uma transição democrática impulsionada por uma correria colectiva que fez Diana Andringa dizer: “As pessoas eram tão diferentes. Já não era o país que tinha os olhos postos no chão. Era o país onde as pessoas olhavam para cima, se entreolhavam, se abraçavam, conversavam entre si. Foi uma energia completamente diferente.”
Democratizar, descolonizar e desenvolver o país. É a regra dos 3 D que rege então o calendário político de Portugal.
Por exemplo, em 1976 foi adoptada uma nova constituição, a democracia venceu, a revolução portuguesa triunfou e, no processo, inspirou movimentos europeus de esquerda.
Este documentário é construído de forma muito inteligente. Porque depois deste 25 de Abril, o realizador Tony Liégois regressa à ditadura que Salazar estabeleceu em 1926.
Para compreender a Revolução dos Cravos é preciso imaginar a pobreza, a vigilância constante, as guerras coloniais, o exílio de quase 1 milhão de portugueses e a ausência de liberdade…
Essa liberdade que encontrou força e poder em 1974 na música “Grândola, vila morena” que hoje se repete em todos os lugares, até mesmo numa série da Netflix (“La casa de papel”.
O documentário ‘Under the Eyelets’ será transmitido hoje à noite às 20h50. O canal Histoire TV está disponível em cabo, satélite, ADSL e fibra óptica.
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