Parlamento português descriminaliza a eutanásia

No final de um laborioso processo legislativo, o Parlamento português votou na sexta-feira a versão final de uma lei que descriminaliza a eutanásia, o que colocará Portugal entre os raros países que permitem que uma pessoa que sofre de uma doença incurável ponha termo à vida. Sofrimento.

A lei foi aprovada graças, em particular, aos socialistas que têm maioria absoluta: 129 deputados votaram a favor e 81 contra, dos 230 deputados da Assembleia.

“Estamos a confirmar uma lei que foi aprovada em diversas ocasiões por uma maioria muito forte”, afirmou a deputada socialista Isabel Moreira, uma das principais vozes a favor da despenalização da eutanásia.

Uma maioria parlamentar liderada pelo Partido Socialista, no poder, já se tinha pronunciado quatro vezes a favor da descriminalização da morte assistida nos últimos três anos. Mas o texto esbarrou então nas reservas do Tribunal Constitucional e do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, um católico conservador e fervoroso.

Para superar o último veto do chefe de Estado, que tem agora oito dias para promulgar a lei, os socialistas decidiram votar uma segunda vez o mesmo texto.

Após a publicação dos decretos de implementação, a lei poderá entrar em vigor no outono, segundo estimativas citadas pela imprensa local.

O texto da lei foi várias vezes reformulado para ter em conta as declarações do presidente, que o vetou duas vezes, e depois de ter sido derrubado, também duas vezes, pelo Tribunal Constitucional devido, nomeadamente, a “imprecisões”.

A nova versão da lei prevê agora que a eutanásia só é autorizada nos casos em que “o suicídio medicamente assistido seja impossível devido à incapacidade física do paciente”.

– “Capricho dos deputados” –

Para defender o seu último veto, o senhor Rebelo de Sousa pediu aos deputados que especificassem quem estava autorizado a “certificar” esta impossibilidade. Mas desta vez os parlamentares recusaram-se a modificar o texto.

As questões levantadas pelo chefe de Estado poderão ser esclarecidas “nos decretos de execução da lei”, sublinhou Catarina Martins, líder do Bloco de Esquerda (BE, extrema-esquerda).

Se a lei for confirmada pelo Parlamento, “não é uma tragédia”, admitiu Rebelo de Sousa, considerando que não levantou “nenhum problema constitucional”.

Tanto para os defensores como para os detractores desta lei, a votação do Parlamento não encerrará o debate público sobre este assunto polêmico num país com uma forte tradição católica.

“A adoção desta lei foi relativamente rápida em comparação com outros grandes países”, disse Paulo Santos, membro do movimento “direito a morrer com dignidade”.

Mas “a luta não termina aí” porque, observa, muitos médicos correm o risco de invocar uma objecção de consciência para não praticar a eutanásia, como fazem alguns em relação ao aborto, legalizado em 2007 por referendo.

“Devemos esperar que a eutanásia provoque ainda mais resistência”, disse à AFP.

Por seu lado, os opositores à descriminalização da eutanásia lamentam que a questão não tenha sido objecto de referendo e esperam que o Tribunal Constitucional seja novamente apreendido pelos parlamentares da oposição.

“É um capricho dos deputados que não quiseram ouvir ninguém”, argumentou José Seabra Duque, membro da Federação Portuguesa pela Vida.

A eutanásia e o suicídio assistido são hoje autorizados num punhado de países europeus, como os do Benelux, os primeiros a autorizá-los, e a vizinha Espanha.

Marco Soares

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